O desenvolvimento da criança através da contação de histórias e a ludicidade na construção do ser humano.

Publicado: 06 de Fevereiro de 2020
Fernando Coelho de Moraes¹
José Eugênio Castro Fernandes²
Rita de Cássia Castro Fernandes dos Santos3
Orientadora: Profª Me. Laís Souza Veríssimo Monteiro4
 
RESUMO
O presente artigo se constitui parte da conclusão avaliativa da Faculdade FABRA – Faculdade Brasileira. O qual tem como objetivo o resgate da ludicidade através da contação de história, mostrando a importância e a dimensão neste ato imaginário, do lúdico e do simbólico sobre suas representações, observando os benefícios que contar histórias trará na vida do aluno, contribuindo no processo de desenvolvimento da criança da educação infantil. Este estudo está permeado pelo case: “Projeto Colorir” – que tem por objetivo a disseminação da Cultura de Paz nas Escolas por meio da Literatura e Contação de Histórias, avaliado e premiado pela Unesco e Fundação Banco do Brasil como tecnologia de enfrentamento à violência nas escolas e também por pesquisas bibliográficas, livros e artigos de revistas científicas. Através do Projeto de Contação de Histórias (acima citado) aplicado nas escolas de Educação Infantil percebeu-se que a criança quando é estimulada através da contação de história, ela além de se tornar leitor, ela também tem um melhor desenvolvimento emocional e social, se tornando um cidadão capaz de mediar os conflitos e propor resoluções de problemas, se relacionando melhor com ela mesma, com o outro e com a sociedade.
 
Palavras-chave: Resgate da Ludicidade. Contação de História. Desenvolvimento da Criança.
ABSTRACT
This article is part of the evaluation of the discipline Fundamentals and Methodology of Early Childhood Education, Elementary and Secondary Education of the Secondary Degree in Pedagogy of the Faculdade FABRA - Faculdade Brasileira. It aims to rescue ludicity through storytelling, showing the importance and the dimension in this imaginary, playful and symbolic act about its representations, observing the benefits that telling stories will bring in the life of the student, contributing in the process of development of children in early childhood education. This study is permeated by the case: "Coloring Project" - which aims to disseminate the Culture of Peace in Schools through Literature and Storytelling, evaluated and awarded by Unesco and Banco do Brasil Foundation as a technology for coping with violence in schools, as well as bibliographic research, books and articles in scientific journals. Through the Storytelling Project (cited above) applied in Early Childhood schools it was noticed that the child, when stimulated through storytelling, not only became a reader, but also had a better emotional and social development, if making a citizen able to mediate conflicts and propose resolutions of problems, relating better to herself, to the other and to society.
  
Keywords: Rescue of Ludicidade. History Account. Child Development.
INTRODUÇÃO
A contação de histórias é uma prática milenar que ajudou a sociedade a conhecer parte de sua própria história através da oralidade, uma história sendo contada de geração a geração até chegar em nossos dias. É fato que contar histórias estimula a criatividade, a memória e com isto estimula o aprendizado. A oralidade é um mecanismo antigo de produção cultural, por meio dela expressamos sentimentos, conhecimentos e experiências. É fato também que com o desenvolvimento e a globalização os meios de comunicação, as tecnologias se desenvolveram tanto que de vez criar sinergia na sociedade, fez com que cada pessoa se tornasse mais individualista, pois a internet nos possibilita comunicação, porém sem estarmos juntos, presencialmente. Vivemos um período onde a tecnologia vem se tornando acessível à todos e as informações chegam rapidamente. Há quase uma década os livros tem sido deixados de lado, esquecidos mesmo, e no lugar tem sido utilizado diferentes tipos de mídias, muitas das quais não contribuem como a leitura dos livros ou a audição de histórias, ou seja, tem se tornado um desafio para o educador fazer com que as crianças se tornem leitores, gostem de ouvir histórias, impulsionem o mundo do era uma vez interior e com isto muitas perdas teremos nestas gerações. Fato que vem se apresentando também na escola, por isto queremos através deste artigo clamar o resgate desta prática para sanarmos os déficits que ocorreram na sociedade. Um professor que não conta histórias não contribui com o desenvolvimento do seu aluno, pois as histórias estimulam memórias, resgatando as experiências de cada aluno por meio das experiências vividas por cada um deles, assim através do ouvir histórias os alunos relacionam os textos com as histórias que atravessam sua história familiar. Pois a contação de história estimula a imaginação, a capacidade criativa, a oralidade, torna a criança leitora, contribui para a formação de uma sociedade envolvendo as competências cognitivas, emocionais e sociais.
DESENVOLVIMENTO
Vamos juntos ter uma visão da história da contação de história, pois no século XVII para o XVIII, as crianças eram vistas como adultos, tinham que cumprir tarefas e tinham cuidados iguais dos adultos, não havia literatura especializada para esta faixa etária, e é fato que neste período havia inúmeras imortalidades. Já que tinham o mesmo tratamento dos adultos a literatura que recebiam era a mesma naquela época. Depois com o advento dos burgueses e com a nova estrutura familiar a criança começou a ser vista como “criança”, diferente do adulto. Somente no século XVIII, a literatura infantil apareceu na escola e com ela a mudança mental sóciocognitiva que a criança começou a ser estimulada a ter. A escola era o oásis onde a criança se sentia criança, pois era preparada para atender as suas necessidades reais. Os primeiros livros foram realizados por professores e pedagogos no final do século XVII e durante o século XVIII. Coelho (2001) afirma que estudar a história é ainda a melhor forma ou o recurso mais adequado de apresenta-la.” (COELHO,2001,p.31)
 
A contação de história é uma atividade milenar que se tem notícia na história da humanidade. Esta prática remete ao surgimento do homem há milhões de anos. Contar histórias constituem prática humano, pois o homem tem necessidade de contar sua própria história e é através da oralidade que o faz, e a história só ficou guardada devido a esta tradição oral, que era passada de pai para filho, isto tudo antecede a escrita. Nas culturas primitivas, ler, escrever e interpretar sinais era de suma importância, pois muito mais tarde se iria ter notícias de registros pictográficos, com as quais iríamos conhecer a história do homem, seu cotidiano, e seria entendido por todo o grupo social. A maneira mais significativa de expressar sentimentos o homem a realizou através das histórias que ele mesmo contava ao retratar suas conquistas, na caça e descobertas. As histórias orais objetivam os fatos e as verdades que não podem ser expressadas pela razão humana, através das histórias são contadas e se tornam verdades, por isto são temidos, por isto nos estudos sobre os contos observa-se: sempre falam de relacionamento humano primitivo, acabam exprimindo sentimentos muito antigos do “psique” humano. (VIEIRA,2005, p. 10). Sempre houve a necessidade do homem em falar dos seus sentimentos, explicações para seus conflitos interiores, transmitir o que é certo e o errado, e isto tem movido gerações de contadores desde a antiguidade até nossos dias no ato de contar, ouvir e recontar histórias. A contação de história sempre tem uma moral, e com ela se passa valores, é uma atuação importante no processo educacional pois contribui na formação e no desenvolvimento da criança desde a educação infantil até a idade adulta. Mas na idade de 3 a 5 anos temos no processo de desenvolvimento da criança milhões de sinapses que ocorrem em seu cérebro tornando esta idade uma fase onde se aprende com maior facilidade. Como a aprendizagem deve ser significativa, as histórias são a forma mais didática de expressar suas vivências que, nas narrativas realistas, acabam não acontecendo. A contação de história não pertence somente ao campo educacional, também pertence à área das ciências humanas e a comunicação. Pois por meio desta arte os homens transmitem seus costumes, tradições e valores, formando cidadãos conscientes do seu papel na sociedade. Por isto quem conta histórias é capaz de criar um ambiente de encantamento, suspense, surpresa e emoção, dando vida aos personagens, causando reações em quem houve e em que conta histórias. Quem conta histórias deve ser capaz de sensibilizar todos os sentidos do homem, entrando pelos ouvidos e tocando na alma (coração) tornando a experiência de viver rica, enriquecendo o ato de ler e com certeza o caminho de cada pessoa que conta ou ouve histórias.
 
A contação de história está ligada ao universo infantil, mas ela não é só pedagógica é andragógico (crianças e adultos) são beneficiados pelo mundo do era uma vez.  O uso desta ferramenta pelo educador estimula o mundo imaginário da criança e estimula também a resolução de conflitos, pois a criança se identificando com os personagens e sabendo que houve soluções para alguns problemas, ela terá certeza que também seus conflitos interiores serão resolvidos. O mundo da imaginação amplia o vocabulários dos envolvidos, o gosto pela leitura, a desejo de narrar suas experiências antes mesmo de escrevê-las, de expressar sua cultura, e a ligação do seu mundo interior com o mundo exterior (o seu íntimo com o social), acontece na hora do conto, desta forma a formação de sua personalidade, seus valores e suas crenças vão sendo solidificados em seu desenvolvimento. As histórias tem papel fundamental nos processos de resolução de conflitos, formando uma sociedade mais tolerante e justa, criando possibilidades, saídas, podendo ser bom e ruim, dando imaginação e estimulando a criatividade.
 
ABRAMOVICH, 1997, P. 37 pontua em sua obra: Chegaram ao seu coração e a sua mente, na medida exta do seu entendimento, de sua capacidade emocional, porque continham esse elemento que a fascinava, despertava o seu interesse e curiosidade, isto é, o encantamento, o fantástico, o maravilhoso, o faz de conta. A contação de história é um momento em que leva os ouvintes ao mundo imaginário e todos são imersos no mundo do era uma vez. O professor que conta história, consegue ter uma cumplicidade com o aluno, pois através das histórias, da oralidade o professor toca no emocional da criança e com isto ela tem empatia e confiança. Geralmente professores que não contam histórias e que recebem contadores de histórias em suas salas percebem que após a atividade seus alunos criam laços com o contador que muitas vezes meses ministrando aula não conseguem tal efeito, este é o ganho para quem conta histórias, atingir o emocional e o efetivo da criança. E não é somente a criança que ganha, quem conta também se aperfeiçoa e se melhora como pessoa conforme FERNANDES, José Eugênio Castro 2003 – Projeto Colorir – Texto Base reflete. “Todos os envolvidos em uma atividade de contação de histórias saem com ganhos emocionais, pois quem conta se aprimora como pessoa e quem ouve se aprimora como sociedade, assim cumprimos o papel de transformação do mundo”.
 
Muitas são as formas de trabalhar com a contação de história, elas acabam não atingindo apenas os objetivos propostos na atividade, mas vão além pois educam, disciplinam (ouvir e falar no momento certo), socializa, desenvolve a criatividade, a inteligência emocional e a sensibilidade para suas questões. Para formar um leitor não basta apensas ensinar a ler, é necessário estímulo e através da contação de história percebemos esta ação, assim muito mais que leitores, formaremos leitores críticos, afetuosos e preparados para as vivências no mundo.
 
Percebemos que quando um professor se utiliza desta ferramenta sua aula fica mais prazerosa, mas para isto acontecer o professor deve se planejar, preparar a história, adequar a faixa etária, separar os recursos que serão utilizados, memorizar a história, usar do seu artista (ator) interno para que a história se torne ainda mais instigante. Há muitos professores que dizem contar histórias porque pegam um livro sem prévio planejamento e lêem para as crianças sem nenhum prepara anterior, infelizmente há neste momento o perigo de formarmos crianças que odeiam este momento, e acabam também não gostando de ler, porque seu professor provavelmente não prepara suas aulas com objetivos adequados e não se aprimora profissionalmente.
 
A história do homem foi perpetuada através da oralidade, sem a tradição oral provavelmente teríamos perdido grandes partes de nossa história, foi assim que preservamos a cultura dos povos e se mantêm até nossos dias. As histórias sendo contadas retratam as pessoas, lugares, acontecimentos, desejos e sonhos e com isto há um ganho na aprendizagem significativa. No documentário histórias há um índio que retrata que em sua tribo os fatos não são registrados em textos, mas com os acontecimentos do cotidiano, exemplo: “fulano nasceu no dia em que houve uma grande chuva de pedras de gelo caindo do céus, os deuses estavam enfurecidos”.
 
Os contos de fadas, fábulas e histórias curativas... se mantêm em uma estrutura fixa, partindo de uma introdução que chamamos de “embrulho” na linguagem teatral, podendo ser uma frase de efeito, um verso, uma poesia...ou uma música.... , logo em seguida temos o desenvolvimento da história, chegando ao clímax momento onde o personagem principal passa por apuros e com grande final como...”E esta história entrou por uma porta e saiu pela outra quem quiser que conte outra...” Partimos de um problema que acaba desarticulando a história, no desenvolvimento buscamos a todo custo a resolução do problema, geralmente introduzimos elementos mágicos, e a solução ocorre no final da narrativa, quando se volta a ter fluidez e a resolução de conflito da história...”todos viveram felizes para sempre”!
 
Betteltheim afirma que as atividades de contações de histórias começam a fazer efeito a partir dos quatro a cinco anos, geralmente são contados as histórias que os pais mais gostavam na infância e ou histórias que tenham maior atração para as crianças nesta faixa etária, exemplo histórias com bichos que falam com narrativas simples com começo, meio e fim e a resolução pacífica de conflitos... ele ainda registra que: “Por exemplo, muitas estórias de fadas começam com a morte da mãe ou do pai. Nestes contos a morte do progenitor cria os problemas mais angustiantes, como isto (ou medo disto) ocorre na vida real. Outras estórias falam de um progenitor idoso que decide que é tempo de nova geração assumir. Mas ante que isto possa ocorrer o sucessor tem que provar-se capaz e valoroso (BETTELHEIM, 2002, p. 14). As histórias tem efeitos terapêuticos pois elas realizam internamente efeitos que ajudam na superação de conflitos que a criança ou um adulto possa estar vivenciando e a resolução do problemas pode ser a resposta que o ouvinte estava procurando. È importante ressaltar que para a neurociência nesta fase da infância de três a cinco anos é onde ocorre o maior número de sinapses, assim a criança começa a memorizar ocorrendo uma aprendizagem significativa e com isto contribuindo para o seu desenvolvimento. [...sempre ocorre a aprendizagem, no entanto, ela só cria raízes no momento em que se torna memória]... do livro (Neurociência em Benefício da Educação, 2016 p34). São inúmeros os autores que se dedicaram a escrever histórias porém pouco se sabe que no início histórias como Chapeuzinho Vermelho foi escrita para o público adulto, para informar sobre os assédios de jovens virgens nos campos...Mais tarde quando a criança foi vista como criança estas histórias foram sendo reescritas especificamente para crianças respeitando seu processo de crescimento e desenvolvimento, contribuindo para a aprendizagem cognitiva, emocional e afetiva. Cito os irmãos mais famosos dos contos de fadas são os Irmãos Grimm – Jacob e Wilhelm Grimm, fazem sucesso até hoje, nasceram na Alemanha ganharam fama devido aos escritos de suas fábulas para crianças entre eles citamos: Branca de Neve, Rapunzel, Cinderela entre outros... Que fazem parte do universo infantil e contribuem e muito para o amadurecimento da criança, o processo de desenvolvimento psicossocial e criatividade. Os irmãos Grimm tornaram a fantasia acessível para as crianças. O professor na educação infantil deve buscar esta motivação dos escritores quando apresentam uma história dos contos de fadas para as crianças, para que as mesmas sintam a beleza do conto, assim consigam apreciar, contextualizar e colocar em prática segundo Ana Mae criadora da proposta triangular presente nos PCN’s e tão estimulada na atual BNCC, no trabalho que tange o trabalho e estímulo das competências, habilidades e atitudes.
 
Uma das histórias mais contadas na idade de zero a cinco anos é João e Maria, os irmãos que são abandonados pelos pais, por estarem passando dificuldades financeiras. Estes contos ajudam a criança a entenderem os efeitos maldosos do ser humano, além de outras observações importantes de quando João marca o caminho com pedaços de pão, estimulam a resolução de problemas e quando as crianças encontram a casa de doces, que para eles era apenas uma forma de se alimentarem, e passando por diversas dificuldades com a bruxa, apresentam um pezinho de galinha que encontram na jaula onde foram trancados, e ao serem perguntados sobre os dedinhos para caso tenham engordado e a bruxa os devorarem, apresentam o pezinho de galinha assim a bruxa acha que os mesmos estão magrinhos demais para serem devorados, o texto é carregado de imaginação e estimulação de resoluções de problemas, este efeito das histórias, estimula interiormente a criança a buscar soluções, ocorrendo o amadurecimento pessoal e a autonomia para resolver seus conflitos interiores. Esse conto é uma simbologia das nossas experiências internas, ligações com nossos pais, a criança nunca imagina que um dia possa ser afastada de seus pais, porém é uma realidade possível, quando por exemplo perdemos nossos pais pela causa da morte, ou seja ninguém está livre de perder seus pais e necessitamos de sobrevivência. É pura simbologia, pois as histórias são carregadas de situações simbólicas e são elas que nos ajudam a compreender os desafios da vida e como superá-los. Na escola não aprendemos apenas os conteúdos programáticos, mas somos preparados para a vida, para ser cidadão do mundo, competentes emocionalmente, socialmente e cognitivamente preparados para resolver problemas.
 
Os gêneros literários são inúmeros, vimos acima a importância dos contos de fadas, mas também são presentes no universo infantil as fábulas, as mais conhecidas são as fábulas de La Fontaine e Esopo, que em suas tramas tem animais que falam, um universo intrigante para as crianças pois se torna pura magia e sempre no final dos textos tem uma moral... Que ensina sempre uma lição. As histórias tem esta função pedagógica ensinar algo, aprender algo...sendo assim nas fábulas em sua própria estrutura nos apresenta no final o porque devemos seguir aquela lição pois aprendemos sempre algo novo, devido aquela conduta do personagem. Segundado Fernandes (2001), fábula é um gênero que, como tantos outros gêneros narrativos, registra as experiências e o modo de vida dos povos. Seu objetivo é trazer reflexões quanto a valores, como respeito, diferenças, amizade, companheirismo, dentre outros. Sobre a moral das histórias GÓES, 1991, P 144 afirma: A moral contida nas fábulas é uma mensagem animada e colorida. Uma estória contém moral quando desperta valor no homem. A moral transmite a crítica ou o conhecimento de forma impessoal, sem tocar ou localizar claramente o fato. Isso levou a pensar que essa narrativa da moralizante nasceu da necessidade crítica do homem, contida pelo poder da força e das circunstâncias. As fábulas resumem uma ação e reação, seguida do discurso que ajudará o leito a refletir. Muitos autores consideram as fábulas um método universal da construção discursiva, com as devidas diferenças de estruturas pois cada povo tem seu modo e costumes. Uma curiosidade é que as fábulas nunca se iniciam com o famoso “Era uma vez...” No Brasil tivemos o escritor Monteiro Lobato que também escreveu fábulas, com uma linguagem simples e coloquial, se utilizando de palavras do cotidiano de uso popular, sempre apresentando um caráter educativo. As fábulas mais conhecidas são:
  1. “A raposa e as Uvas”;
  2. “A cigarra e a formiga”;
  3. “A lebre e a tartaruga”;
  4. O leão e o ratinho”;
  5. A galinha dos ovos de ouro”;
  6. A rosa e a borboleta”;
  7. A menina do leite”;
  8. “O lobo e a cabra”;
  9. “O cachorro e a sombra”.
  10. “Os viajantes e o urso”;
  11. “O gato, o galo e o ratinho”; dentre outras.
 
Existe ainda as histórias curativas, a médica e autora Susan Perrow (2010) propõe trabalhar histórias terapêuticas para comportamentos desafiadores. As histórias propõem o envolvimento e a mudança de comportamento da criança. Um relato muito significativo FERNANDES, José Eugênio Castro escreve (2003). “Em 2006 fui convidado por uma assistente social de uma determinada casa de cuidados com crianças portadoras do vírus HIV (ONG), para que me apresentasse como contador de história com uma proposta nada convencional... Ela relatou que neste período quando uma criança morria devido a complicações pelo fato de estar fraca e com baixa imunidade onde as doenças oportunistas se instalavam na criança levando à óbito, aterrorizava as outras crianças pois elas acreditavam quem este também seria o fim delas, e com este medo de morrer, a imunidade das crianças ficavam desprotegidas e outras acabam sendo internadas e chegavam a óbito, pelo simples medo de morrer. A assistente social então me apresentou um livro, chamado A História de uma folha do autor Léo Buscaglia, onde a história de uma árvore repleta de folhas viventes com voz, nomes e seus conflitos passam juntas por todas as estações e como todos já sabem as folham caem no inverno, dando chance de novas folhas nascerem, as que caíam se tornavam adubo fértil, para que a árvore que por anos tinha as protegido agora receba novas folhas, é como se fosse um ciclo da vida, nascer, crescer, desenvolver e morrer, sem um final filosófico e nem religioso, apenas cientifico que após a morte todos vamos para debaixo da terra. Perguntei a assistente social se ela estaria me propondo contar uma história sobre a morte e ela disse que sim, pois as histórias por serem simbólicas iriam dar suporte emocional e entendimento as crianças sobre o ciclo da vida e que a morte não seria um fim, mas parte deste ciclo. A proposta me deixou muito inseguro, nunca havia trabalhado tal temática, levei para casa e refleti, li e reli a história, até que por uma luz de entendimento entendi que a mensagem principal do livro não era o final da história mas o diálogo que as folhas personagens principais do livro tinham...sobre o propósito da vida. E em cima deste propósito foi que me inspirei para contar esta história para cinquenta e cinco crianças portadoras do vírus HIV naquela instituição, construí material lúdico, um avental com uma linda árvore com eva e com folhas coladas com velcro que conforme iam caindo pelo tempo iam se descolando da árvore. O tempo todo da história então firme com as crianças o que seria o “propósito da vida”, e perguntei a elas qual seria o propósito das folhas... E elas me disseram: dar sombra, acolher os visitantes do parque... eu então perguntei se elas achavam que aquelas folhas da história tinham cumprido seu propósito e elas me responderam felizes sim, que havia sido cumprido. Então voltei a pergunta e a gente qual é o propósito da nossa existência...E logo me veio a resposta.... sermos felizes e fazermos os outros felizes. Me contive naquele momento para não chorar, pois a emoção tomou conta....Em seguida todos foram convidados após a história a plantarmos sementes de feijão em um potinho com algodão molhado.... E elas fizeram...Pedi ainda que acompanhassem e elas acompanharam.... dias depois fui a instituição e elas relataram que os feijões haviam crescido, alguns tinham dado até novos feijões, mas que ao final de algum tempo perceberam que mesmo molhando a plantinha foi perdendo força até morrer... Esta história foi significativa e simbólica para aquelas crianças e fizeram todas elas refletirem sobre o sentido da vida, mesmo que em idade ainda imatura cerca de seis à 12 anos....Mas após alguns meses a assistente social relatou em relatório que não mais as crianças tinham após algum ter ido para o hospital ficado doentes com medo da morte, mas que se sentiram fortalecidos com o propósito da vida, e desejosos de vencer aquele momento e superar. E entenderam que o mais importante é que enquanto vivos fossemos felizes e fizéssemos os outros felizes.
 
Este relato exemplifica bem a proposta do artigo falar do desenvolvimento da criança que sabemos que existem fases, etc... Mas estas temáticas não tem fases e cada ser humano pode vivenciar em algum momento da vida. E é preciso entender os processos da vida, do crescer, do aprender, do socializar, do desenvolver e até o do morrer. Quem nunca teve em sua sala alguma criança que perdeu algum ente querido? Quem em sua sala de aula como professor nunca passou pela perda de um aluno? Isto significa que as história podem ser uma ferramenta capaz de trabalharmos assuntos diversos e que os resultados são muito significativos, pois causam o amadurecimento da criança e o entendimento do mundo.
 
É de suma importância resgatarmos a técnica do contar histórias em nossas salas de aula, ela precisa estar mais presente no cotidiano escolar. Se desenvolvendo pelo planejamento do professor, ou com o convite de contadores de historias da comunidade na escola apresentando repertórios variados ligados a proposta do planejamento, não somente como divertimento mas como proposta de atividade de aprendizagem, também é de suma importância levar as crianças para além dos muros da escola, conhecer bibliotecas onde ocorram atividades de contação e outros espaços públicos, como a FLICS – Feira Literária Capixaba de Livros onde se pode conhecer uma diversidade de autores capixabas que escrevem obras especificamente para o público infantil. O professor deve integrar o universo literário em seu planejamento, em suas aulas. Muitos escritores e pensadores falam sobre a importância do trabalho com textos, livros e literatura na sala de aula.
 
Considerando que a contação de história é portadora de significados, símbolos e contribuem no processo de aprendizagem da criança na prática pedagógica do professor, não pode ser utilizada apenas para que a criança goste de ler ou aprenda linguagem.  Ela desperta a curiosidade, a criatividade e a produção literária do próprio aluno, mesmo que no início seja de forma pictórica chegando a escrita, o importante é que o universo da imaginação, da criatividade da criança seja estimulado para o mundo encantando do era uma vez. É uma ação que transcende a palavra, vai além...
Esta ação do contar histórias, não pode ser usado apenas para passar tempo, ou como divertimento, deve ser usando dentro do planejamento com objetivos específicos a serem atingidos pelo professor, deve adentrar a sala de aula enriquecendo a prática do professor, promovendo conhecimentos e aprendizagens diferenciadas. É notável pela bibliografia que a contação de história deve ser usado como metodologia no processo de desenvolvimento da criança em vários aspectos em sua formação global, além é claro de ser parte das estratégias ou recursos das metodologias ativas tão faladas em nossos dias, através da taxonomia de BLOOM (2001) onde se propõe que o aluno passe no processo de aprendizagem pelo acesso ao conhecimento, compreensão, análise, aplicação, síntese e avaliação. Este processo faz com que a aprendizagem se torne ainda mais produtiva e a contação de história pode ser o fio condutor. A contação de história nunca acontece como um momento isolado, sempre após as contações não de forma avaliativa, podemos propor atividades que fortaleçam o aprendizado da criança e se ficar na memória como vimos anteriormente ficará como aprendizagem para a vida.
 
Na práxis pedagógica temos a contação de história, a função da contação de história não perpassa apenas pela beleza, pelo lúdico ou pelo prazer, mas o caráter artístico gera um elo tão grande capaz de contribuir no processo de ensino aprendizagem. Como reflete MIGUEZ (2000)...”Na maioria dos casos, a Escola acaba sendo a única fonte de contato da criança com o livro e, sendo assim, é necessário estabelecer-se um compromisso maior com a qualidade e o aproveitamento da leitura como fonte de prazer”.
CONSIDERAÇÕES:
Através deste artigo, afirmamos através das inúmeras referências e das vivências que a Contação de Histórias cria condições para a formação integral do ser humano, principalmente a quem se dirige este artigo, as crianças, devendo ser valorizada e desenvolvida esta prática no meio escolar a fim de desenvolver a formação das crianças, no que tange a imaginação, a linguagem, a atenção, a memória, os valores para uma vida em sociedade, o gosto pela leitura, a disciplina do saber ouvir e o momento de falar, outras competências, habilidades e atitudes humanas, contribuindo para o processo de aprendizagem, no desenvolvimento afetivo, cognitivo, emocional e social da criança, pois esta ferramenta encanta e envolve a criança neste processo ensino aprendizagem, sendo um recurso mágico para que o professor consiga estabelecer vínculos com os discentes.
 
É de suma importância que o professor seja leitor, bem como pais e responsáveis pois só irá contribuir neste processo quem também se faz leitor, ou ouvinte ou contador das histórias. Dentro do processo do contar é imprescindível o planejamento da atividade, o professor nunca deve improvisar este momento. E deve planejar conhecendo a história, memorizando a mesma, avaliando os recursos melhores para serem usados na hora de contar, adequar as faixas etárias as histórias que serão contadas, pois cada faixa etária tem um interesse próprio pela literatura. Os professores se tornam nesta jornada mediadores, proporcionando encantamento, desenvolvendo também a autonomia para que a criança resolva seus conflitos internos, sendo protagonista e buscando sua superação pessoal nas histórias.
 
O mundo do Era uma vez deve ser apresentado através da Contação de Histórias e por que não apresentá-lo desde cedo. É na faixa etária da educação infantil que a criança torna-se capaz de aprender com maior facilidade como vimos no que a neociência nos propõe, que entre treze cinco anos é a fase onde a criança mais aprende. Entâo devemos propor esta atividade desde a creche até a idade adulta, pois a Contação de História é pedagógica, mas também é andragógica, ou seja, é eficaz no trabalho com crianças e adultos. E faz efeitos tanto em quem conta quanto em quem ouve.
 
Também vimos no artigo sobre as histórias terapêuticas, elas são importantes no processo de superação de situações vivenciada pela criança, e ajudam no amadurecimento do caráter. O relato dado no artigo trata de que a história tem um processo de cura interior, não que estejamos nos tornando terapeutas quando contamos histórias, mas para nos alertar da responsabilidade do ato de contar histórias, pois as palavras alcançam o coração da criança e com isto transformações interiores bem como superações de traumas vivenciados por elas podem ser superados, daí a importância de um planejamento e adequação da história que será contada, nada de improviso, neste campo não há espaço para o fazer sem planejar.
 
Este artigo teve o objetivo de evidenciar sobre o processo de ajuda e articulação da contação de história no processo de desenvolvimento da criança na escola, é um recurso fantástico e com resultados já mensurados. Com base neste estudo esperamos ter contribuído com nossos leitores e estimular para novas descobertas em relação ao mundo encantado da literatura infantil, buscando novas formas, nestas incluímos as novas tecnologias despertando nas crianças a magia da leitura. Esperamos enfiam que este artigo fomente ainda mais iniciativas para que mais professores se descubram como mediadores de leitura, como contadores de histórias e coloquem sua prática, práxis e missão de educador descobrindo a cada dia formas de estimularmos mais leitores desde a educação infantil até a idade adulta.
 
REFERÊNCIAS:
 
ABRAMOVICH, Fanny. Literatura Infantil: gostosuras e bobices. São Paulo: Scipione, 1997.
 
BETTELHEIM, Bruno. A psicanálise dos contos de fadas. 14.ed. São Paulo: Paz e Terra, 2000.
 
BETTELHEIM, Bruno. A psicanálise dos contos de fadas. Tradução de Arlene Caetano. 16 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2002.
 
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FERNANDES, José Eugênio Castro. Projeto Colorir: Livro Institucional da Oscip Colorir Criando Valores, 2003.
 
GÓES, Lúcia Pimentel. Introdução à literatura infanto juvenil. 2. Ed. São Paulo: Pioneira, 1991.
 
IRMÃOS GRIMM. Quem foram os Irmãos Grimm: contos infantis. Disponível em: http://www.bigmae.com/quem-foram-os-irmaos-grimm-contos-infantis/ Acesso em: 17 jun. 2019.
 
PEREIRA, Silvana Cristina Bergamo; HILA, Claudia Valéria Dona. Novos Olhares para o gênero fábula: uma proposta de sequência didática. UNOESTE, 2007. Acesso em: 19 jun. 2019.
 
PERROW, Susan. Histórias curativas para comportamentos desafiadores. Tradução de Joana Maura Falavina. Antroposófica: Federação das Escolas Waldorf no Brasil. 2010.

¹Graduado em Designer Gráfico – UCL – ES. Licenciado em Artes pela FABRA – ES. Licenciado em Pedagogia pela FABRA – ES.
²Graduado em Recursos Humanos – CETFAESA – ES. Licenciado em Sociologia pela FABRA – ES. Licenciado em Pedagogia pela FABRA – ES. Especialista em Psicopedagogia Clínica e Institucional pela UNIG em parceria com ABPC – ES.
³Graduada em Pedagogia - CESAT - ES. Licenciada em Letras/Português - FABRA - ES, Especialista em Gestão - FERLAGOS - RJ.
4Doutoranda em Direito FDV 2019, mestra em Educação no Sistema Prisional, Especialista em: Educação Especial D.A., Gestão e Supervisão Escolar, Educação Infantil, Docência do Ensino Superior e Filosofia e Sociologia da Educação. Graduada em Direito, Pedagogia e Filosofia. Atualmente é professora da faculdade Fabra e Prefeitura da Serra/ES.


 

 

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